Almanaqueiras: ou não queiras.

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quarta-feira, 12 de abril de 2017

o fenômeno é consequência da mentalidade

Inflação de notas 

Helio Schwartsman 




"Pai, tirei A na prova de matemática", proclamou, orgulhoso, meu filho Ian. Como pai consciencioso que sou, elogiei-lhe o desempenho, mas, inoculado pelo vírus da desconfiança por causa de um livro que li que menciona o problema da inflação de notas, fiquei com a pulga atrás da orelha. Um A nos dias de hoje vale o mesmo que nos meus tempos de ginásio?

Muito provavelmente não. Não fui capaz de encontrar dados para o Brasil, mas o fenômeno da inflação de notas está bem documentado em países como os EUA e o Reino Unido, em especial no ensino superior. De acordo com Tom Nichols, autor de "The Death of Expertise" (a morte da expertise), em Yale, mais de 60% das notas conferidas já são A- ou A.

Estudos sistemáticos confirmam essa tendência. Um trabalho de Stuart Rojstaczer envolvendo 200 instituições de ensino superior nos EUA mostrou que, a partir do final dos anos 90, o A se tornou a nota mais comum dada, alcançando os 43% em 2008. Isso representa um aumento de 28 pontos percentuais em relação a 1960. Se somarmos o A e o B, eles constituem hoje mais de 80% das notas conferidas em todas as matérias.

A hipótese de Nichols, que parece fazer sentido, é que o fenômeno é consequência da mentalidade "o cliente sempre tem razão". Hoje, não só as escolas evitam ferir a autoestima de seus alunos com notas baixas como ainda tentam criar para eles ambientes onde se sintam bem ("acolhidos" é o termo favorito dos pedagogos) ao longo de todo o processo.

Ninguém é contra as pessoas se sentirem bem, mas nunca é demais lembrar que o processo educacional frequentemente exige que o aluno seja retirado de sua zona de conforto. Ele precisa ser exposto a todo gênero de ideias, principalmente as que lhe causem repugnância, e deve descobrir desde cedo que muito dificilmente será sempre a pessoa mais inteligente da turma. Espero que meu filho não leia esta coluna.

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