Almanaqueiras: ou não queiras.

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quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

"Sou pobre mas sou limpinho"

SER POBRE É BOM E EU GOSTO

Tião Lucena


Uma jornalista de São Paulo, que escreve em O Globo, fez um artigo mangando dos pobres. Ela queria ser engraçada e terminou sendo. Pobre é aquilo mesmo que ela disse. Mas é aquilo tudo porque dá valor as coisas simples. Se o pobre bota uma roupa limpa, engomada e as vezes nova para ir ao médico, como ela destacou,faz isso porque considera o médico uma figura quase santa,que salva vidas e merece respeito.

Aliás, respeito é uma coisa muito em falta nesses tempos de hoje. Principalmente respeito aos mais velhos,aos pais, aos santos, a Jesus Cristo, aos bons costumes e por aí vai.

A jornalista em questão, por exemplo, tem cara de quem vai pra cama com o namorado na primeira noite. Isso é falta de respeito aos bons costumes. Duvido que a mocinha pobre faça isso. Primeiro conhece o moço, depois leva-o a presença do pai e da mãe, namora uns tempos para aprender a gostar e somente depois disso tudo, admite alguma intimidade.
Eu particularmente gosto de pobre, porque sou pobre. Nasci pobre de jó. Morava, quando menino, numa casa cujo teto era o chão batido e o banheiro um tonel e uma cuia. A gente se aliviava na Pedra do Urubu e limpava o cu com folha de marmeleiro.

Mas éramos felizes.Tínhamos amor pra dar e receber. Nossa casinha humilde, equipada com um fogão a lenha que jogava fumaça por um bueiro de zinco, era o nosso recanto de paz.Na hora do almoço era bonito ver a mesa rodeada de buchudos, com Seu Miguel na cabeceira comandando o banquete, e dona Emília servindo o feijão de corda com arroz do Piancó, a costela de boi cozinhada na panela de barro, o molho de pimenta para abrir o apetite e, debaixo da mesa, o cachorro Tupi, nosso companheiro de aventuras infantis,esperando o osso para roer.

Essa moça deve ter nascido num apartamento de quarto e sala. Com certeza foi produto de um parto cesariana e jamais mamou no peito da mamãe.Ela não sabe o que perdeu. Eu mamei nos peitos de Dona Emília até a idade de três anos.Eu e meus sete irmãos. Por isso até hoje estamos aqui, taludos e fortes, nunca quebramos um braço e jamais fomos internados para arrancar uma tripa. Mas eu falava da moça que mangou dos pobres.Coitada, nunca comeu bolo de caco, jamais apreciou um bode guizado com cuscuz, uma rabada de boi com macaxeira, um ovo de capoeira fritado na banha de porco, uma lapada de cana para abrir o apetite e um forró de ponta de rua, aquele gostoso forró com o sanfoneiro, o zabumbeiro e o triangueiro que tinha hora para começar e não tinha hora para terminar.

Não recriminemos,porém, a moça.Ela agiu sem má fé. Quís ser engraçada com a miséria alheia, porém terminou expondo a sua própria miséria, miséria de espírito, mísera frivolidade de quem nasceu, cresceu e vai morrer sem saber o que é felicidade, amor correspondido e uma foda gostosa, daquelas que faz o cunhão encolher e os cabelos do cu baterem palma.

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