Almanaqueiras: ou não queiras.

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terça-feira, 27 de junho de 2017

"Ricardo", "Celso", "Edgar" e "Coronel"

A questão a ser investigada é o papel de Michel Temer

Marcelo Coelho



Para fins de comparação: a denúncia apresentada pelo Ministério Público contra Lula, no caso do tríplex do Guarujá, tinha 149 páginas. A que Rodrigo Janot acaba de divulgar, contra Temer e seu ex-assessor Rodrigo Loures, tem 60.

Para Janot, o presidente "recebeu para si, em unidade de desígnios e por intermédio de Rodrigo Loures, vantagem indevida de R$ 500 mil, ofertada por Joesley Batista, proprietário do grupo J & F, tendo sido a entrega dos valores realizada por Ricardo Saud, executivo do grupo".

A célebre "compra do silêncio" do ex-deputado Eduardo Cunha, que levaria à acusação de obstrução da Justiça por parte de Temer, não é mencionada. Em outro documento, a PGR afirma que seria necessária uma análise mais cuidadosa, aprofundada e responsável para formar opinião sobre isso.

A gravação da conversa entre Joesley e Temer, entretanto, tem sua autenticidade reafirmada e justifica pontos fundamentais da denúncia.

O principal, para a Procuradoria-Geral da República, é que o dono da JBS estava interessado em ter pessoas favoráveis a seus interesses em vários órgãos federais, como o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), a CVM (Comissão de Valores Mobiliários), e a Receita.

Rodrigo Loures teria se prontificado com Joesley a levar alguns nomes para que Temer fizesse as nomeações. Havia, ademais, um problema específico no Cade, órgão encarregado de combater práticas monopolísticas na economia.

Uma empresa do grupo JBS em Cuiabá se queixava dos preços impostos pela Petrobras na venda de gás natural. Deixaria de perder R$ 1 milhão por dia se lhe fosse permitido comprar gás diretamente na Bolívia, em vez de passar pela Petrobras. Rodrigo Loures foi então acionado por Joesley para intervir junto ao Cade.

O problema é que, aparentemente, segundo depoimentos de funcionários do Cade, Loures não conseguiu alterar nenhum procedimento usual nas decisões do órgão –apesar de ter falado em nome de Temer.

Acontece que, no dia 13 de abril de 2017, o preço do gás foi resolvido por um acordo entre a Petrobras e a empresa do grupo JBS. A pendência vinha desde setembro do ano anterior. A conversa entre Joesley e Temer, na qual o presidente indicou Rodrigo Loures como interlocutor, foi em 7 de março. Feito o contrato com a Petrobras, em 13 de abril, o assessor de Temer recebeu R$ 500 mil no dia 28 do mesmo mês.

Seria apenas uma parcela: segundo conversa gravada entre Loures e Saud, os pagamentos seriam semanais, variando conforme os preços cobrados pelo gás da Petrobras.

Nada a ver com Cunha e seu silêncio, portanto. A questão a ser investigada, sem dúvida, é a de qual o papel de Temer nesse acordo com a Petrobras. As parcelas de R$ 500 mil destinavam-se ao presidente?

A PGR transcreve outras conversas entre Loures e Saud, em que se mencionam vários personagens, como "Ricardo", "Celso", "Edgar" e "Coronel". Seriam possivelmente pessoas que intermediavam pagamentos ilícitos para Temer.

Num trecho comprometedor, RoLoures indica que o "coronel" (provavelmente João Batista Lima Filho) e outro ex-assessor de Temer, José Yunes, já "não podem mais" –entendendo-se que seria necessário arranjar outros intermediários para as propinas oferecidas pela JBS.

Denúncia não é acusação formal: trata-se apenas do pedido para que se abra processo. Após alguns passos em falso iniciais, a suspeita contra Temer se consolida agora.

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