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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

a bicha malandramente balança a cauda.

Cientistas descobrem que corrupção não surge aos poucos, mas de uma vez
Folha de São Paulo 




No país da Lava Jato, muita gente deve estar se perguntando como um cidadão inicialmente honesto se transforma num corrupto de mão cheia. Um estudo holandês investigou essa questão, e os resultados indicam que a metamorfose pode ser repentina: dada a oportunidade, qualquer um está sujeito a cometer corrupção da grossa.

Os especialistas liderados por Nils Köbis, do Departamento de Psicologia Experimental e Aplicada da Universidade Livre de Amsterdã, queriam saber se o comportamento corrupto é mesmo o que se costuma designar, em inglês, com o termo "slippery slope", algo como "ladeira escorregadia".

"Slippery slope" é expressão usada em debates quando uma pequena brecha no comportamento considerado moralmente aceitável é vista como desculpa para coisas cada vez mais questionáveis.

No debate sobre manipulação genética de humanos, por exemplo, os contrários à prática argumentam que permitir que pais selecionem embriões com base no sexo do futuro bebê (digamos) levará a uma seleção de características consideradas desejáveis -cor do cabelo e dos olhos, altura- e, no fim, a alterações ainda mais intrusivas, com consequências desastrosas para a nossa espécie.

A "escorregada" que a equipe holandesa estudou não é nem de longe tão apocalíptica. O que eles queriam saber é se, para cometer um ato sério de corrupção, a pessoa precisa primeiro passar por uma fase de "preparação psicológica", agindo de forma antiética de maneira aparentemente mais suave antes de dar seu grande golpe.

A ideia é que essa fase inicial da descida da "ladeira escorregadia" levaria o corrupto embrionário a pensar que não está fazendo nada de mais, que seus atos foram só um meio para resolver um problema chato com mais rapidez. Com isso, ele continua a ter uma autoimagem positiva e não percebe ter cruzado uma linha perigosa quando faz algo mais sério.

JOGO DA LICITAÇÃO

Para testar a validade da hipótese, Köbis e seus colegas organizaram o que podemos chamar de Jogo do Leilão (no Brasil, poderia ser apelidado de Jogo da Licitação).

No jogo, dois participantes, que começavam com uma quantia fixa de créditos virtuais, tinham de dar lances para ver quem ganhava o prêmio da brincadeira (veja infográfico). Em algumas versões do experimento (foram quatro variantes), esses créditos eram convertidos numa pequena soma em euros.

Cada jogador desempenhava o papel de dono de uma construtora, enquanto outro jogador fazia as vezes de funcionário público responsável por administrar o leilão.

Como os dois jogadores podiam apostar todos os seus créditos no leilão, e como ambos recebiam o mesmo valor inicial, a estratégia "honesta" era simples: fazer a oferta máxima, de modo que o funcionário público dividia a licitação igualmente entre as duas empresas, de modo que ambas tinham um lucro.

Havia, porém, uma "cláusula de malandragem": era possível oferecer suborno ao funcionário público, o que dava aos donos da empresa uma vantagem injusta em relação a seu concorrente.

É aí que foi possível testar a ideia de "slippery slope". Um dos grupos de participantes podia oferecer de cara uma propina muito sedutora ao funcionário -férias em Paris com tudo pago. Já o outro tinha de primeiro oferecer apenas um jantar e só depois tinha a chance de dar a passagem para a França. No primeiro caso, a vitória na licitação ficava garantida, no segundo a chance de vencer o leilão ficava 50% maior.

Resumindo: quando havia a oportunidade de oferecer a superpropina, as pessoas tendiam a agarrá-la.

"O comportamento antiético nem sempre surge gradualmente, mas às vezes ocorre de forma abrupta, espontânea e inesperada", diz Köbis.

"As pessoas podem querer obter as vantagens ligadas a formas marcantes de corrupção numa única ação." O especialista diz esperar que estudos sobre como as pessoas tomam decisões sobre esses temas ajudem a criar mecanismos que minimizem os riscos de corrupção na vida real.

O estudo foi publicado na revista especializada "Psychological Science"

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