2016 através da música
Imagine se o ano de 2016 pudesse ser retratado através da música brasileira. Qual ou quais as músicas melhor representariam este que já entrou para história como um dos mais tenebrosos para o Brasil.
Para começar, o ano poderia muito bem ser cantado na música imortalizada por Cazuza:
“Brasil
Mostra tua cara
Quero ver quem paga
Pra gente ficar assim
Brasil
Qual é o teu negócio?
O nome do teu sócio?
Confia em mim”
Quem sabe na constatação e indagação embravecida de Renato Russo:
“Nas favelas, no senado
Sujeira pra todo lado
Ninguém respeita a constituição
Mas todos acreditam no futuro da nação
Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?
Que país é esse?”
Qual música deveria ser lembrada após o Senado Federal ter sacado, definitivamente, a então presidenta da República Dilma Vana Rousseff da Presidência sem que tivesse ela cometido qualquer crime de responsabilidade, o que caracterizou um golpe parlamentar. Embora tenha se tornado um hino de um dos momentos mais terríveis da história recente do Brasil, a composição do genial Chico Buarque poderia muito bem ser cantada por Dilma, que também foi vítima daquele momento da história:
“Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão
A minha gente hoje anda
Falando de lado
E olhando pro chão, viu
Você que inventou esse estado
E inventou de inventar
Toda a escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar
O perdão
Apesar de você
Amanhã há de ser”
Embora tanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como a ex-presidenta Dilma Vana Rousseff não tenham nomeado ministros e ministras do Supremo Tribunal Federal em troca de favores futuros ou mesmo pensado em gratidão, com certeza a música que segue e que ficou famosa na voz inconfundível da sambista Beth Carvalho, deveria ser cantada tanto por Lula quanto por Dilma para as ministras e ministros do STF por eles nomeados:
“Você pagou com traição
A quem sempre
Lhe deu a mão
Você pagou com traição
A quem sempre
Lhe deu a mão
Mas chora!”
E para a grande mídia – para o pig – neste ano que finda, principalmente com os ataques a Dilma e ao Lula por parte da imprensa golpista, bem como o tratamento desigual e desproporcional dada pela mídia ao Partido dos Trabalhadores em relação ao demais, a divertida música do velho roqueiro “irmão camarada”, Erasmo Carlos, se adéqua muito bem:
“Pega na mentira
Pega na mentira
Corta o rabo dela
Pisa em cima
Bate nela
Pega na mentira…”
Para os delatores, nunca foram tantos, que para se libertar das algemas e do cárcere acusam qualquer um, o pagode de Bezerra da Silva cai feito uma luva:
“Na hora da dura
Você abre o cadeado
E dá de bandeja
Os irmãozinhos pro delegado
Na hora da dura
Você abre o bico e sai caguetando
Eis a diferença, mané, do otário pro malandro
Eis a diferença do otário pro malandro”
Ao povo e ao trabalhador tão sofrido que vem perdendo seus direitos, a extraordinária “Construção” de Chico Buarque é mais atual que nunca:
“Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”
Não há dúvida, 2016 foi um ano inesquecível, um ano em que não apenas algumas, mas muita coisa “está fora de ordem, fora da nova ordem mundial…”, no dizer de Caetano Veloso. Foi um ano de “muitas emoções”, mas é preciso resistir, é preciso lutar, é preciso ter esperança e, finalmente, como diz o poeta:
“É preciso amar as pessoas
Como se não houvesse amanhã
Porque se você parar pra pensar
Na verdade não há”
Leonardo Isaac Yarochewsky é advogado e Doutor em Ciências Penais.
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