Almanaqueiras: ou não queiras.

Almanaqueiras: ou não queiras.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

JK imortal

Homônimo de Juscelino Kubitschek faz sucesso entre os pacientes do HOB

Leilane Menezes - C. Braziliense


Juscelino Kubitschek de Oliveira trabalha no Hospital Oftalmológico de Brasília (HOB). É mineiro, alto, magro e tem 38 anos. Não, não é um delírio. O médico é um homônimo do criador de Brasília. Compartilha, além do nome, a mesma profissão e o estado natal. Foi batizado em homenagem ao político, um grande amigo de seu pai, José Maria. Os dois — o pai e o então futuro presidente — encontraram-se em Belo Horizonte (MG). José trabalhava em uma ferrovia e conheceu JK quando ele era médico, antes da carreira política. Criaram um vínculo de admiração mútua.

À época em que JK precisou deixar o Brasil, pressionado pelo governo militar, o idealizador da nova capital trocou cartas com vários amigos durante o exílio nos Estados Unidos, em Portugal e na França. Muitas eram endereçadas a José Maria. O ex-presidente escrevia sobre tristeza, amargura em ficar longe de seu país. José respondia com mensagens positivas e pedia conselhos ao amigo ilustre sobre trabalho.

Quando o filho nasceu, José Maria não pensou duas vezes antes de dar a ele o nome do ídolo. “Meu pai ficou emocionado com a atenção que recebeu, com o respeito e consideração que JK demonstrava. Minha família já tinha o sobrenome Oliveira, então combinou certinho”, explicou Juscelino.

Seu José lia as correspondências trocadas com JK para os filhos pequenos. Queria que soubessem desde cedo quem foi aquele homem. Juscelino tornou-se o primeiro médico da família, seguindo os passos de JK. “Mas não pensem que vão me ver na política. Isso, nem pensar. Eu gosto dos bastidores, de falar sobre o assunto, mas não tenho vontade nenhuma de me candidatar”, avisou.

Hoje, Juscelino cuida dos olhos dos brasilienses. É oftalmologista, coordenador do Setor de Glaucoma do HOB. Nasceu em Januária, de onde conserva o sotaque, com direito a muito “sô” e “uai”. Mudou-se para o DF depois de casar-se com a brasiliense Renata, uma colega de profissão, há 13 anos. O doutor enfrenta olhares surpresos a cada vez que se apresenta a um paciente ou a qualquer pessoa na rua.

Nem longe de Brasília Juscelino tem sossego. Até na Espanha, onde cursou especialização, o médico precisou explicar várias vezes a origem do nome. “Todo mundo acha que sou parente de JK. Mas não sou. Tenho um orgulho enorme e me sinto cheio de responsabilidades por carregar uma homenagem como essa no meu nome”, afirmou. Sempre que vai a congressos, seja como palestrante ou ouvinte, Juscelino é alvo de brincadeiras. “E aí, presidente?” ou “Como vai, doutor JK?” são cumprimentos frequentes. Ele adora.

Reações
Alguns assustam-se de verdade com a coincidência. Outros colegas do oftalmologista encaminham pacientes ao consultório dele no HOB quando precisam de um especialista em glaucoma. Eles dizem: “Esse assunto não é comigo. Você precisa procurar o doutor Juscelino Kubitschek”. Segundo o médico, pode haver outra razão: “Muitos pensam que eles estão aconselhando uma cirurgia espiritual”.

Juscelino fala, aos risos, dessas confusões. Certa vez, uma mulher brigou com o médico que fez tal indicação. “Eu não vou procurar espírito coisa nenhuma. Minha religião não permite. Não me aconselha uma coisa dessas. Não faço cirurgia assim, não”, ela disse. Antes que o colega de Juscelino pudesse explicar o mal entendido, a senhora deixou o consultório batendo o pé, nervosa com a proposta.
Há também quem se surpreenda e fique feliz com a coincidência. “Pessoas mais idosas, pioneiras, por se sentirem parte do sonho de JK, adoram quando eu falo meu nome. Admiram demais o presidente. Eu percebo a satisfação das pessoas, ganho a simpatia delas logo de cara. Recebo muito carinho”, relatou.
Um desses pioneiros é José Ari de Souza, 75 anos, paciente de Juscelino. Ele está em Brasília desde 1959 e chegou a trabalhar no Catetinho. “Eu achava que o doutor era parente de JK. Tinha certeza. Mas se ele nega…”, contou, meio na dúvida. “Os dois Juscelinos têm a simpatia em comum, o jeito de tratar as pessoas, bem de perto”, elogiou José Ari.
Juscelino atende, inclusive, membros da família Kubitschek. Sente-se honrado. “Quando alguém me escolhe como médico, seja quem for, é como se eu fosse homenageado”, disse. Até a placa do carro do doutor leva as iniciais JKO. O médico, porém, é obrigado a ocultar o sobrenome famoso, a contragosto, às vezes.
No trabalho, por exemplo, assinar o nome completo já provocou equívocos. O médico escreve artigos com frequência e dá entrevistas sobre oftalmologia na televisão e em outras mídias. “Quando a gente manda e-mail com sugestão de artigo, por exemplo, e o anexo vai com o título de ‘Entrevista com Juscelino Kubitschek’, muita gente nem abre. Acha que é vírus. Para evitar confusão, nesses casos, eu assino Juscelino Oliveira.”
Em 1997, Juscelino Kubitschek de Oliveira conheceu Brasília. Ficou encantado pela dinâmica da cidade. “É diferente de lugares maiores. Você encontra os amigos por acaso, vê a mesma pessoa várias vezes”, admirou-se. As tesourinhas, as superquadras, o Parque da Cidade. Tudo encheu os olhos do médico, que valoriza as qualidades e tenta esquecer os defeitos. “Quem chega a Brasília dá de cara com um sonho, o sonho de Dom Bosco. É o encontro com o futuro, encontro de todos os brasileiros. Aqui eu me sinto bem, afagado. Eu me reencontro todos os dias em Brasília”, declarou-se.
Falar do céu de Brasília corre o risco de parecer um clichê, mas não quando é Juscelino quem o descreve: “O céu parece não ter fim. Sinto-me seduzido”. Ao juntar Juscelino e sua Brasília, o diagnóstico não poderia ser outro: é um caso de amor, irremediável.


Nenhum comentário:

Postar um comentário