Almanaqueiras: ou não queiras.

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sexta-feira, 14 de setembro de 2018

é assim que se faz: não precisa dizer o nome do coiso.

Quero amá-los, aquecê-los, servir-lhes pudins de caramelo e mantas quentinhas

Tati Bernardi


Acho engraçada a moda "pare de me seguir" contra os bolsolovers das redes sociais. Não, gente, está tudo errado! Precisamos é combinar um abraçaço com esses humanos desorientados. Quero mandar para eles pudins embebidos no mais puro caramelo, lantejoulas douradas, unicórnios fosforescentes, mantinhas de sofá bem quentes. Eu quero amá-los, aquecê-los, servi-los. Tudo isso porque, talvez —e aqui vai uma última esperança—, se eles forem mais felizes, se eles não odiarem tanto o mundo e a própria condição humana, mudem de ideia.

Não acho que o eleitor do presidenciável em questão seja ingênuo (burro já é outra história). Eles sabem que o cara é homofóbico, racista, machista e fã de torturador. Deletar e bloquear essas pessoas, torcer para que elas se mudem deste planeta e aqui fique só a nossa galera parece ser o mínimo que nos cabe para proteger um latifúndio chamado "pelo amor de Deus, não me estrague esta encarnação". O problema é que desse jeito não vai funcionar. Não vai ser no "fique aí com sua ignorância que eu vou ficar aqui com minha sagacidade" que vamos nos livrar da depressão democrática que assola o país.

Tenho pena da geração que não viu a Super Xuxa lutar contra o Baixo-Astral, mas tenho ainda mais pena da geração que não estudou ditadura nas escolas (e pavor de quem estudou e concordou). Não gosto do verbo "assolar"; ficou meio brega na frase acima, mas usei ele mesmo assim para ilustrar que às vezes é preciso sair da bolha zona oeste, "ai, tipo, meu sapato ecológico da Vila Madalena vai salvar o planeta, meu", e olhar, com carinho (ou sem tanto desprezo), para as pessoas que usam o verbo "assolar" e acreditam que, tendo a lua aquela gravidade onde o homem flutua, merecia a visita não de bailarinos (e de você e eu), mas de militares.

Não vamos construir um Brasil melhor usando calcinhas veganas, mas quem sabe possamos começar a arquitetar um bairro menos esnobe ao dar um sorriso para quem desfila tênis de corrida com bermuda cargo jeans, almoça no Outback e escreve "construir um Brasil melhor". Façamos nossa parte por um discurso menos "eles contra nós". E por que acabei falando em hostilidade estética em uma tentativa de argumentar sobre algo bem mais sério? Não tenho a menor ideia. Me perdi, pode acontecer com qualquer um.

Você, eleitora do dito-cujo, por favor, fique perto de mim. Deixe eu te falar a maravilha que é não ser assediada no trabalho, não ser desrespeitada dentro de casa. Meu salário é igual ou até superior ao dos meus colegas homens. Meu marido só gritou comigo uma vez, e foi para me avisar que a música estava muito alta. Eu tenho uma vida ótima porque mereço e, não sei se você sabe, você merece ainda mais: nunca, em nenhuma hipótese, sofrer violência ou preconceito ou maus-tratos. Você é digna de júbilos incontáveis porque não existe nada mais grandioso do que ser mulher.

Por isso, no dia 29 próximo, no largo da Batata, milhares de mulheres vão se unir contra o homem que tem na cabeceira da cama o livro do maior torturador do país. Milhares dirão não ao boçal que xinga opositoras de vagabunda e as coloca na categoria "não merece nem ser estuprada".

Mas, se você é contra essa manifestação feminista/feminina/humana, se você se identifica com o Trump, se você quer pessoas armadas discutindo no trânsito (com os filhos no carro), se você prefere um país onde tudo se resolve na bala, no cala a boca, na truculência, na morte completa da decência e da delicadeza: por favor, me siga.

Tati Bernardi
Escritora e roteirista de cinema e televisão, autora de “Depois a Louca Sou Eu”.

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