Nós, o povo
Martha Medeiros- Zero Hora
Ninguém tem bola de cristal pra saber como terminará este inquietante 2016, mas acredito que o momento é perfeito para deixar de lado a disputa entre coxinhas e petralhas e pensarmos juntos no país que desejamos para o futuro. Nunca participei de nenhuma manifestação, pois não concordava com o espírito partidário das mesmas e não tinha vontade de caminhar lado a lado com alguns reaças notórios, mas, a partir de 16 de março, aderi ao constrangimento e à vergonha nacionais. Ficou confirmado tudo o que intuíamos: nossa classe política é um desastre. Todos os governos fizeram algo de bom durante suas gestões, mas a volúpia pelo poder e pelo dinheiro sempre estraga tudo. Admito que me incomodam os grampos telefônicos realizados recentemente, considero violência qualquer invasão de privacidade, mas a situação é de guerra e estão todos usando as armas que têm – de ambos os lados. Não é uma coisa bonita de se ver, mas é o que temos pra hoje.
Qual o nosso papel nisso tudo? É preciso ter consciência de que a corrupção não começa no governo: termina ali. Começa dentro de nossas casas, no trânsito, no nosso cotidiano civil. Somos um povo que passa trote em telefones de emergência, que falsifica carteiras de estudante, que faz gato para roubar energia elétrica e telefonia a cabo, que atravessa a rua fora da faixa de pedestre, que alerta os carros velozes na estrada para o radar que está logo em frente, que estaciona em vaga para deficientes e idosos, que forja atestados médicos para faltar ao trabalho, que molha a mão do policial para evitar multas, que pula catracas, que guarda lugar em auditórios para os amigos atrasados, que leva para casa cabides de hotéis, que joga lixo nas calçadas, que acha normal não cumprir o horário combinado, que falsifica a assinatura dos pais, que adultera o odômetro do carro antes de vendê-lo e mais um longo etcetera. Não estou falando dos outros, e sim de nós. Sem isenção. Os políticos não vêm de Marte, eles são frutos desta mesma sociedade. Nunca teremos representantes éticos se não formos uma sociedade ética.
Então, tudo bem ocupar as avenidas e protestar, mas sem hipocrisia: ou a gente muda, ou nada muda. Que essa catarse coletiva leve em consideração a nossa responsabilidade nisso tudo. Que aproveitemos para amadurecer e reconstruir essa nossa mentalidade viciada em jeitinhos. E que, finalmente, venham novos dias.
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