Almanaqueiras: ou não queiras.

Almanaqueiras: ou não queiras.

sábado, 17 de janeiro de 2015

Uma geração de gente chata e sem um pingo de humor. Triste.

JE SUIS PASQUIM 

Eduardo Pereira



Moleque por volta dos quatorze anos, eu ia de segunda a sexta-feira entre vinte e vinte e uma horas ao Centro Acadêmico da Faculdade de Filosofia de Cajazeiras, aí pelo início da década de setenta, e ouvindo clássicos do rock internacional e da MPB de então (Beatles, Mick Jagger, Caetano, Chico, Milton e mais uma ruma de vozes musicais privilegiadas), tínhamos, minha turma de jovens, de lambuja, a leitura dos jornais da imprensa alternativa, Opinião, Movimento e, principalmente, Pasquim. Eram periódicos que faziam resistência a ditadura militar de plantão.

O Pasquim era o mais disputado por causa de sua linguagem inovadora e sedutora recheada de ilustrações, cartuns, charges, mesmo codificada no intuito de ludibriar a censura militar vigilante. O Pasquim usava uma linguagem que quebrava a etiqueta da sala de estar da Academia Brasileira de Letras e dava o tom da elevação da descontração sem ser grosseiro. Com esse ingrediente não seria de se estranhar que os jovens fossem seduzidos por essa linguagem de onomatopeias visuais, entrevistas sem edição onde até os palavrões eram reproduzidos com charme, fotos dos entrevistados e entrevistadores fumando e bebendo uísque, o que seria impossível hoje em dia pelo emparedamento do politicamente incorreto.

Com o Pasquim não escapava a igreja católica, os médicos, os policiais, e muito menos seu prato predileto: a raça dos políticos. Com humor mordaz, Ziraldo, Henfil, Millôr, Jaguar, Paulo Francis, Ivan Lessa e mais uma extensa turma delirante, inteligente e sedutora a flor da pele espicaçava todos os quadrantes culturais, costumes, políticos, etc. que encontrava em sua frente. Mesmo sendo censurados, presos, perseguidos, a turma do Pasca resistia e influenciava a imprensa brasileira. Em Cajazeiras não seria diferente com o pessoal do jornal Tribuna Popular capitaneado por Nonato Guedes, Luis Alves, Beto Montenegro, José Audísio, José Alves, Josival Pereira, Tarcísio Siqueira e mais uma extensa turma que se auto intitulava também de ‘turma’ como os ipanemenses.

Depois do Centro Acadêmico da FAFI, refrescados pela irreverência pasquiniana, dávamos uma esticada até a Biblioteca Castro Pinto para darmos uma corujada nos prováveis livros recém chegados. Jorge Amado, sucesso editorial no país, era a linha de frente em empréstimos e Jubiabá tinha lista de espera. Também aproveitávamos para fazermos pesquisas escolares na enciclopédia Barsa. Malditos escrotos preguiçosos que arrancavam as página exatamente que nos interessavam para elaboração dos deveres.

Inescapável sairmos da Castro Pinto sem um livro, mesmo que não fôssemos lê-lo por inteiro. Nosso objetivo, influenciados pelos textos exuberantes do Pasquim, eram demonstrarmos que éramos intelectuais como os pasquinianos, e, para demostrar nossa sapiência e impressionar as garotas que paquerávamos, colocávamos os livros debaixo da axila demonstrando claramente que éramos intelectuais de sovaco. Isso mesmo, não passávamos de intelectuais de sovaco.

O Pasquim acabou e Ziraldo criou a Bundas como continuação do Pasca. Faliu e depois ele insistiu mais uma vez com o Pasquim 21, que também fechou. Os tempos mudaram e o mundo perdeu o humor e está perdendo o Charlie. Não se crê mais em religião como antigamente. Que falta a imprensa brasileira faz de um Pasquim, ou de uma Revista do Henfil, Chiclete com Banana, Ovelha, Revisa Casseta e Planeta, Ovelha, Careta... 

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