Almanaqueiras: ou não queiras.

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quarta-feira, 29 de maio de 2013

Um convite à reflexão!

ESTAVA PENSANDO NO PROMOTOR DE JUSTIÇA QUE DISSE SER UM ORGULHO SER COMPARADO A UM NAZISTA. 

Daí escrevi o texto abaixo e mandei-o para a Zero Hora. Como não sei se haverá publicação, posto-o aqui.

A FORÇA DAS PALAVRAS

Germano Schwartz


Antes de tudo. Sou Germano até no nome. Friso para que se saiba o lugar da minha fala. Mais: sou Doederlein e Schwartz. Minha descendência alemã é evidente, muito embora eu me considere absolutamente brasileiro. Nasci aqui. Criei-me e vivo em solo brasileiro. De fato, muito pouco tenho de costumes alemães, exceto, talvez, o pendor pelo rigorismo acadêmico (do qual me orgulho).

De qualquer sorte, como lembra Heidegger, a linguagem é a casa do ser. De alguma forma somos o que dizemos, e, também, tornamo-nos aquilo que escrevemos, falamos, proferimos e lemos. A linguagem (de)limita nosso horizonte de sentido. Não há como sair da cápsula em que nos encontramos (ou da floresta) sem que ampliemos nossas possibilidades de compreensão.

Dito de um outro modo. Há algum tempo eu assisti a um filme denominado “A Força das Palavras“. Recomendo-o. Nele o personagem central toma para si um texto de outrem, baseado em uma experiência pessoal terrível vivida pelo autor fático da obra. Quando, arrependido, o plagiador contata o escritor para lhe devolver a autoria das linhas, recebe a seguinte resposta: “Carregue consigo essas palavras. São muitas as dores nela contidas. Que elas, as dores com as quais foram escritas, lhe acompanhem, pois você é, agora, o dono delas “.

Fortes são as palavras. Seus efeitos transcendem o ato de comunicação em si. Elas desvelam sentidos. Revelam posições. Descortinam sofrimento, preconceitos, e, também, o ápice do ser humano em sua virtude extrema (justiça).

Lembrei disso tudo quando na terça-feira dessa semana assistia ao programa Conversas Cruzadas da TVCOM. O tema versava sobre a situação prisional gaúcha e a prática de prisões domiciliares como alternativa, em alguns casos, para a progressão de regime. Confesso que essa tema não é de meu agrado. Advogo em outra área, diferente da criminal. Mas trata-se de uma chaga social da qual todos estão, de uma maneira ou de outra, envolvidos.

A certa altura o membro do Ministério Público gaúcho, instituição que nos orgulha sobremaneira, diz, literalmente: “para um promotor de justiça, ser chamado de nazista significa estar fazendo bem o seu trabalho”. Claro, havia um contexto. O defensor público o havia acusado como tal porque não concordava com a hipótese de encarceramento total pugnada pelo membro do parquet. O moderador do programa, estupefato, ainda perguntou ao agente do Ministério Público de que maneira seria bom ser comparado a um nazista. A resposta foi a de que ele, o promotor, no desempenho de suas funções, precisa ser rigoroso.

Mas a partir daí eu desliguei. Um turbilhão de pensamentos passou na minha cabeça. Pensei no que diria a comunidade judaica, a comunidade GLT, os negros, os deficientes físicos, entre outros, todos perseguidos de forma bastante rigorosa pelo regime nacional socialista alemão. Ainda hoje, quando me xingam (não são poucas as vezes, em especial quando devolvo as provas de meus alunos) e querem me atingir, chamam-me de nazista. Lembram? Sou Germano. Alemão é nazista, no que Warat denominava de senso comum teórico. Lembrei das atrocidades estampadas em Auschwitz, lugar em que estive com minha esposa. Imaginei que em um país periférico e miscigenado o uso de tal palavra não ecoasse no sistema social.

Mas ecoou. E eu não me atrevo a dizer mais nada, exceto que desejo ao Promotor de Justiça o mesmo que o autor do livro no filme “As Palavras” ambicionou: “Carregue consigo essas palavras. São muitas as dores nela contidas. Que elas, as dores com as quais foram escritas, lhe acompanhem, pois você é, agora, o dono delas”.

A vida imita a arte e nesse caso a pena, alternativa, seria mais do que suficiente.

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