Não tinha como. Eu acreditava em Papai Noel. Papai Noel para mim era um sonho. O sonho da concretização de ganhar brinquedos. A alma infantil é prática. A alma infantil é interesseira. Interesseira com cem por cento de pureza. O deleite de ganhar, mais especificamente um carrinho de brinquedo, era o espírito natalino do ângulo infantil. Mais do que isso, o espírito natalino naquela Cajazeiras de minha alma infantil era sair para Praça dos Carros e ver aquela feira noturna iluminada com lâmpadas presas a fios pendentes nas bancas. Era o Natal.
Para aquela criança cajazeirense da década de sessenta, Papai Noel era uma criança vestido de velhinho. Era um velhinho com espírito infantil, pois é voltado totalmente para a imaginação dos pimpolhos. Comprar apitos e ficar apitando em conjunto com todas as crianças presentes àquela Praça era incorporar o espírito natalino. O soar do apito era o aviso de que os sinos bimbalhavam. Ninguém se achava importunado com aquele apitaço, porque os adultos entendiam o verdadeiro espírito natalino de seus fedelhos. Quem iria contrariar uma criança inebriada de espírito natalino?
A comida gostosa preparada por mamãe era um outro ingrediente da saborosa festa. As vizinhas mandavam doces, bolos e quitutes mais. A missa realizada na Catedral também era um outro valor cultivado. Caminhar pela rua Pedro Américo e na confluência da Padre José Tomaz e ver um mundaréu de gente descendo pra Praça dos Carros e pra Praça João Pessoa se constituía o retoque da receita de um Natal repleto de felicidades. Era gente vestida com roupa de ver Deus para ver a lapinha no final da Praça João Pessoa. Era ali, ao pé da escada do baldo do Açude Grande, que víamos a manjedoura. Aquele presépio iluminado com lâmpadas coloridas clareava mais ainda a festa da cristandade. Era assim, nessa singeleza de cotidianeidade que transcorria a chamada festa da cristandade. Era assim que era a riqueza dessa festa interiorana. Era assim que todos se sentiam, confraternizados.
No dia seguinte, nós, guris presenteados com carrinhos, amarravamos cordões nas frentes de nossos carrinhos e saíamos puxando em passeata pelas calçadas da Rua Pedro Américo, pela calçada do Grupo Dom Moisés Coelho, pelas calçadas da Praça do Espinho e outras calçadas circunvizinhas. Todos queríamos mostrar nossos carrinhos, orgulhosos por termos sidos atendidos por Papai Noel. O espírito de humanidade era tão cristalino que, nós, meninos puros, não distinguíamos os carrinhos melhores dos piores. Não existia concorrência, mesmo tendo carrinhos movidos à corda dos mais abonados. Eram aqueles carrinhos que se puxava pra trás e soltava e ele corria sozinho. Onomaitopeicamente fazíamos o ronco dos motores de nossos carrinhos.
Desfeita a carreata de carrinhos, já em casa, ficávamos deitados no chão pegado em nosso carrinho e movimentando-o para frente e para trás e acelerando o motor num vruuuummm! Vruuummm! Estávamos dando uma amaciada na máquina. Por alguns dias estávamos em lua de mel com nossos possantes.
Nossos pais ficavam sossegados por alguns dias. Nossas atenções estavam voltadas exclusivamente para nossos veículos. Mamãe podia até chamar pra gente ir almoçar que não ouvíamos, que não tínhamos fome. Tínhamos fome de brincar, tínhamos fome de usufruirmos aquele momento eterno. Tão eterno que hoje lembro-me de tudo. Tão eterno que aquela criança não morreu em mim.
Mesmo com três dias de atraso, desejo feliz Natal para todas as crianças adultas amigos meus espalhados por Cajazeiras, Pombal, Patos, Campina Grande, João Pessoa, Recife, Fortaleza, Porto Velho, São Paulo, e por qualquer lugar onde essas crianças adultas cajazeirenses estiverem. Até as do céu que estejam brincando nas nuvens eternas, eternas como qualquer criança soube viver dentro de seu tempo. Feliz Natal e próspero ano novo, crianças!
Eduardo Pereira
E-mail: dudaleu1@gmail.com
NATAL, QUE DATA LINDA!
ResponderExcluirFraterno Tadeu: o Natal é uma criança!
ResponderExcluirEduardo Pereira.