Almanaqueiras: ou não queiras.

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domingo, 26 de fevereiro de 2017

"Sou bobo, mas sou feliz, muito mais bobo é quem me diz"

Trump e Kim Jong-un fazem pensar se há elo entre penteado e pensamento

Antonio Prata



Se Donald Trump, o ditador dos Estados Unidos, tuitar que Kim Jong-un, o ditador da Coreia do Norte, "é bobo"; se Kim Jong-un, do alto de sua maturidade, responder "나는 바보입니다하지만 난, 나에게 말하고 더 바보 행복" ("Sou bobo, mas sou feliz, muito mais bobo é quem me diz"); se Donald Trump, conhecido por sua cautela, mandar uma ogivazinha pra Pyongyang; se Kim Jong-un, generoso, retribuir o presente e o mundo acabar, uma coisa é certa; a humanidade terá sido exterminada pelos dois líderes com os penteados mais esdrúxulos que já apareceram debaixo do Sol. E da Lua. E das câmeras da Fox News. E do Comitê Central de Radiodifusão Coreano.

Não dá pra não se perguntar: haverá alguma relação causal entre penteado e pensamento? Digo, não da forma que críamos até hoje, que o pensamento radical levava ao penteado radical, punks com moicanos, rastafáris com dreads, o Arnaldo Antunes com seu incrível botocudo rock'n'roll: e se for o contrário? Bem, que os joysticks mais aptos a aproximar o "game over" da nossa espécie estejam nas mãos de um "comb-over" platinado e de um indescritível trapézio invertido –já compararam o ditador coreano a um bebê equilibrando um velho telefone sobre a cabeça– é um forte indício de que estou certo.

O cabelo talvez funcione como uma espécie de antena das ideias. É pelos folículos capilares –quem sabe?– que apreendemos a realidade exterior. É pelos folículos capilares que excretamos as caraminholas vencidas -toxinas das nossas angústias e frustrações. E como tratam suas antenas e exaustores pilosos os dois cavaleiros do apocalipse?

Amy Lasch, ex-cabeleireira de Trump, declarou ao site do jornal britânico "The Daily Mirror": "Ele usava tanto laquê para chegar naquele penteado que o cabelo era uma massa emaranhada, sólida". Já Li Lee, dona de um salão coreano em Londres, revelou ao "Guardian" que o telefonão de Jong-un "não é muito fácil de se conseguir num cabelo asiático" e é sustentado à base de permanente e cera.

Veja, dois cérebros lacrados por litros e mais litros de cera e laquê: uma casca espessa como o pétreo pururuca de um pato laqueado, como a crosta crocante de um fried chicken, uma impenetrável aduana química impedindo um intercâmbio saudável entre o que se passa dentro e fora da massa cinzenta destes solitários cidadãos. Com suas antenas untadas, Trump e Kim Jong-un recebem tantos "inputs" do mundo ao redor quando nossos celulares recebem sinal no meio de um túnel na rodovia dos Imigrantes. (Não foi casual, aqui, a escolha da rodovia).

O cenário é desesperador, mas também otimista. Se a barreira que nos separa do apocalipse nuclear é tão fina quanto um fio de cabelo, também é da ordem dos mícrons a distância que nos afasta da salvação. Basta uma chuva, um balde, uma bexiga cheia de água para derreter o muro que os aprisiona no inferno de seus pensamentos.

Empapados, Donald e Jong-un olharão em volta, primeiro com ódio, depois rindo (a brisa da mudança já refrescando seus córtex embolorados), então começarão a chorar, comovidos, e as lágrimas sinceras descongelarão seus corações, levando pra longe o longo inverno e trazendo de volta os raios do astro rei ("Frozen", Disney, 2013); e será Carnaval sobre a Terra; e sob as câmeras da Fox News e do Comitê Central de Radiodifusão Coreano os dois sairão sambando e cantando "A Jardineira".

Ou não. Talvez tudo se exploda mesmo e o mundo acabe num enorme topete atômico. Bom Carnaval.

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