Açude Cedro enfrenta consequências da seca.
Reservatório no Sertão Central está com 0,2% da capacidade total de água desde setembro. Obra foi uma das primeiras respostas em forma de infraestrutura à seca no Nordeste
O Povo
A primeira grande obra hidráulica moderna da América do Sul perdeu a função. Ao menos até o próximo inverno — se ele for bom —, já não há água para o açude Cedro, em Quixadá (no Sertão Central), armazenar. Após cinco anos consecutivos de estiagem no Ceará, o recurso que sobrou está misturado à lama e representa 0,2% da capacidade do equipamento. Rachaduras cobrem a maior parte do que antes estava submerso. Da base ao topo, a barragem pode ser vista em seus 20 metros de profundidade e mais de 400 metros de extensão.
Mesmo quando cheio, as águas do reservatório não são usadas para abastecimento da população, atendida pelo açude Pedras Brancas. Entre moradores da região e técnicos em gestão hídrica há consenso: isso garantiu que ainda houvesse água até este ano. “Já era previsto que iria esvaziar. Tanto que foi liberada a pesca para tirar os peixes que já iriam morrer (sem água)”, explica José Cláudio, secretário do Comitê de Bacias do Banabuiú.
De acordo com Edelson Santos, 29, presidente da Associação de Moradores do Açude do Cedro, a medida amenizou, mas os problemas enfrentados pela população permanecem. “Ainda tem muita morte de peixe, de tartaruga… O açude está assoreado”, aponta. Segundo ele, quem vivia do turismo ou da pesca está fazendo “malabarismo para sobreviver”. “Ele seco até é um atrativo, mas os turistas vêm e vão embora. Não ficam, não consomem, não tem banho”, resume.
A alternativa encontrada pelo comerciante Robério dos Santos, 52, para manter o restaurante que gerencia foi comprar pescados do Castanhão. Ele explica que o nível do reservatório se manteve até março, mas a situação piorou nos meses seguintes. A esperança do comerciante é a próxima quadra chuvosa. “Pode ser que seja um inverno bom”.
Desde setembro, o nível do Cedro se mantém em 0,2% da capacidade total. O cenário é o pior registrado pela Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) desde 2004, desde quando os dados estão disponíveis. O pior registro até então tinha sido em janeiro de 2009, quando o açude tinha 2,6% da capacidade total.
História
Criado no período Imperial, por dom Pedro II, o projeto do Cedro foi a medida tomada em resposta à seca entre os anos de 1877 e 1879. A obra, iniciada em 1890, viu a República ser implantada no Brasil antes de ser concluída, em 1906. Eduardo Segundo, coordenador estadual do Departamento Nacional das Obras Contra as Secas (Dnocs) no Ceará, destaca o pioneirismo do equipamento nas obras de convivência e combate à seca.Contudo, ele aponta que o projeto perdeu parte das funções ao longo dos séculos com o crescimento da população. “Construíram muito grande, tanto que poucas vezes sangrou”, explica. (Igor Cavalcante)
Mobilização
O governador Camilo Santana (PT) realiza, na manhã de hoje, encontro sobre a convivência com a seca e a transposição de águas do rio São Francisco. A obra é aguardada pelo Ceará desde a primeira metade do século XIX. O prazo de conclusão foi adiado para setembro do próximo ano.
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