Almanaqueiras: ou não queiras.

Almanaqueiras: ou não queiras.

terça-feira, 9 de agosto de 2016

texto especialmente dedicado aos frequentadores do Almanaqueiras. belo, mano.

PUTA É UM PUTA ELOGIO.




A atriz Letícia Sabatella, estrela de filmes, minisséries, novelas de TV e peças de teatro, aplaudida pelo público e crítica, em razão de ser uma das atrizes mais festejadas de sua geração, ainda assim, recentemente sofreu linchamento moral e foi hostilizada em sua cidade natal, só não descambando para algo mais grave, graças à sua atitude pacifista, à sua firmeza de caráter e a intervenção de terceiros. Não, não foram cenas de uma novela, um filme ou uma peça de teatro. Pura realidade. Entretanto, de tudo isto exala o alento de que “Toda dor pode ser suportada se sobre ela puder ser contada uma história.”

Alguém cujo nome não vale a pena mencionar, um filhote do Banestado, a chamou de puta, porque não encontrou nela nada mais  que pudesse ofendê-la.

Nos tempos volvidos, cruzando a ponte para o passado, lembramos que uma das palavras que mais feriam uma mulher, era chamá-la de “moça-velha”. Muitas asseguravam que preferiam morrer “puta-velha”. Mas, “moça-velha”, nunca.

Hoje, ser chamada de puta fere, mas não ofende tanto quanto ser taxado de fascista. Rubens Casara diz que: “o fascismo possui inegavelmente uma ideologia de negação. Nega-se tudo (as diferenças, as qualidades dos opositores, as conquistas históricas, a luta de classe etc.), principalmente, o conhecimento e, em consequência, o diálogo capaz de superar a ausência do saber. O fascismo é cinza e monótono, enquanto a democracia é multicolorida e em constante movimento...”.

Salvo honrosas exceções, os agredidos não retribuem as agressões na mesma proporção. Ela se manteve decentemente, dizendo apenas que eles não eram democráticos. Quem é rotulada de puta, precisa segurar os impulsos para não agir impensadamente. Não há nada que se possa fazer diante de xingamentos carregados de ódio e vazios de sentido, a não ser o desprezo. Mas mereciam umas sabateladas.

Vem-me à mente, agora, o episódio do Pastor Malafaia e o jornalista Boechat, quando o âncora do Jornal da Band, não mais suportando às investidas do pastor, disse que ele era: “explorador da fé alheia” e manda em português bem claro, ele “procurar uma rola”. Bem feito.

Muito bem. Mas afinal o que seria puta, esse adjetivo tão doce que brota volta e meia, na boca da nossa sociedade?
Muitos já conhecem sua origem, pois serve para a sociedade dar às mulheres um papel de gênero restritivo.

À expressão puta, está associada à mulher “fácil” da vida, ou seja, meretriz. Conquanto tal palavra — mulher que pratica sexo em troca de dinheiro.

Não é à toa que os locais onde se praticavam a prostituição [frejo, bordel, puteiro ou baixo meretrício] serviam para os cavalheiros saciarem suas lascívias com as “desonradas” mulheres “da vida fácil”.

Pelo que se sabe, Leticia não é puta, não é petista, nem tampouco comunista, todavia sempre que considerou conveniente fez oposição ao Governo de Dilma. É uma puta de uma mulher decidida, eu diria. Levantou-se não em defesa de um ou outro governo, mas por algo muito mais importante e caro para as sociedades: a democracia. “Democracia que tem como objetivo a libertação dos indivíduos das coações do autoritarismo...”. Não esqueçamos também que “Quem habita este planeta não é o Homem, mas os homens. A pluralidade é a lei da Terra.”

O que mais provoca incômodo numa sociedade de base patriarcal e fundada nos pilares machistas na qual vivemos, é saber que a mulher não tem mais medo de se expressar, não vê motivos para se calar e não faz nem questão de saber o que os outros pensam dela.  Podem ser putas, mas decididas, atrevidas que desafiam com sua atitude liberal a todos e a tudo. Isto incomoda.

A violência aparece onde o poder está em risco. O regime político ditatorial que o Brasil vive atualmente tem gravíssimas consequências sociais e em razão disto, se estabeleceu uma cisão social radical que podemos chamar de apartheid social.

Em tempos como estes:

“Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma,
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma,
A vida não para…
Enquanto todo mundo espera a cura do mal,
E a loucura finge que isso tudo é normal,
Eu finjo ter paciência.
O mundo vai girando cada vez mais veloz,
A gente espera do mundo e o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência…”
In: Paciência – de Lenine


JOHN CARTAXO

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