Em Lisboa, solitário, Perivaldo assume os erros: 'Foi a morte do artista'
Ex-jogador do Botafogo, Palmeiras, Bahia e Seleção vende roupas usadas em feira e diz ter perdido dinheiro com uma mulher, carros e maus investimentos: 'Fiz tudo errado'
O Globo

Primeiro à esquerda, no alto, Perivaldo no Botafogo de 1980: boas lembranças (Foto: Jorge Marinho / Agência O Globo)
Bob Marley pelo visual, Peri pelo nome. E brasuca pela origem. É assim que Perivaldo Lúcio Dantas, 60 anos, é conhecido pelos vendedores da Feira da Ladra, em Lisboa. É no tradicional mercado da capital portuguesa que o ex-jogador da Seleção, do Botafogo, Bahia, Palmeiras e Bangu vende roupas e objetos usados para se sustentar. Perivaldo vive em Lisboa há 23 anos e perdeu o contato com quase toda a família no Brasil. Só não perdeu a boa disposição e a alegria de viver. Como lateral-direito, para ele, só Carlos Alberto Torres e Toninho Baiano foram superiores. Mas, se em campo, era capaz de acertar cruzamentos na medida, como o para Mendonça em vitória sobre o Fla por 3 a 1 nas semifinais do Brasileiro de 1981 (assista ao vídeo acima), na vida disse ter cometido erros capitais. Desde os amigos aos conselhos ruins responsáveis pela mudança do rumo da sua vida. Uma mulher, carros e maus investimentos foram os grandes problemas, segundo o baiano, que afirmou não ser alcoólatra mas parou para beber uma cachaça. E ele se assumiu como grande culpado pela situação difícil em que se encontra.
Botafogo no coração
Dentro de campo, a maior saudade é da camisa alvinegra. Peri da Pituba foi revelado pelo Bahia nos anos 70 e estourou no Botafogo no início dos 80, indo depois em 1983 para o Palmeiras e, no ano seguinte, para o Bangu, antes de partir para o exterior.
- O Botafogo fez tudo por mim. A torcida me adorava porque eu marcava muitos gols. Era da defesa mas era artilheiro também. Tinha raça, treinava de manhã, à tarde e à noite. Disposição nunca me faltou. A torcida sabia que eu tinha raça e era lindo ouvir 70 mil pessoas gritando 1,2,3,4, 5 mil, quem não gostar do Perivaldo vai na Polícia do Rio, recordou Rei da Pirituba animando a feira.
Como jogador, as melhores recordações que Perivaldo guarda, além dos gols, foi a vitória do Botafogo sobre o Flamengo por 3 a 1 nas semifinais do Campeonato Brasileiro de 1981 - ele centrou na medida para Mendonça marcar o primeiro -, as vitórias no Campeonato Baiano com o Bahia em 1975 e 1976 e um amistoso com a seleção brasileira contra a antiga Tchecoslováquia no Morumbi, quando o então lateral-direito salvou um gol certo numa espetacular puxeta. Uma acrobacia que lhe rendeu a admiração de meio mundo e também o aproximou dos colegas Zico e Junior, que passaram a respeitá-lo, mesmo depois de ter provocado a expulsão do Galinho num clássico Botafogo x Flamengo.
- O Zico? Foi ele que esquentou a cabeça. Foi ele que se expulsou, o lance foi indiscreto, não dá para falar aqui não. Mas na Seleção os que mais me ajudaram foram ele e o Junior. E eram eles os que mais me detestavam em campo. Eles falavam que eu era chato, mas me ajudaram muito depois - continuou.
Do passado de jogador, Perivaldo não se importa de falar. Ri quando lembram dos momentos em que irritava a torcida com os centros por trás do gol. Fala também com alegria da boa disposição nos treinos aos gritos da torcida até a comparação com outros da posição. E o ex-lateral cita o capitão do tri mundial da Seleção Carlos Alberto Torres e Toninho Baiano, ex-Fla e Flu, na “eleição” do melhor brasileiro da posição.
- Só esses dois jogaram mais bola do que eu.
Hoje, o Rei da Pituba acompanha pouco o futebol e a seleção brasileira, mas sonha em assistir a um jogo da Copa no Brasil. Baiano de nascença e carioca de adoção, leva as duas cidades no coração e até no sotaque em que mistura as duas cadências ao sotaque luso. Mas é no Rio de Janeiro, onde a torcida mais o emocionou e onde disse ter vivido os melhores momentos de sua vida, que Perivaldo quer fazer sua última boa jogada.
- Rio de Janeiro é a minha terra, é lá que eu vou encerrar a minha vida. E não é um sonho, é realidade mesmo.
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