Almanaqueiras: ou não queiras.

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segunda-feira, 18 de outubro de 2010

CONFISSÕES DE UM À TOA

A briga por ter maior religiosidade, entre José Serra, que já apareceu em foto fazendo a primeira comunhão na propaganda eleitoral, e Dilma Rousseff, que também já apareceu no guia eleitoral comungando com véu na cabeça,  por causa de quem é a favor ou contra o aborto, levou-me a lembrar que, eu, um sujeito que não tem religião definida, provavelmente meu voto não será bem recebido nem por um nem por outro presidenciável que disputa à tapa-publicitário o eleitor brasileiro.

Pelos preceitos da religião católica eu deveria ter feito a primeira comunhão seguindo todos seus rituais e, filho de uma mulher catolicíssima, não fiz o curso para se obter o diploma da primeira comunhão. Valdim, meu irmão mais velho do que eu, fez, com direito a foto e tudo.

Para se ter noção do catolicismo materno, minha mãe ia, de segunda a sexta-feira, à missa das seis horas na Matriz juntamente com Dona Rosinha, mãe de João Robson, nosso saxofonista mor, e também com dona Lilia, esposa do maestro Esmerindo Cabrinha. Todas elas vizinhas de rua.

Já que eu não gostava de religião minha mãe impôs-me a condição de assistir pelo menos uma vez por semana a uma missa, e eu ia aos sábados, como já narrei no texto que escrevi anteriormente com o título de “Onde se discutia futebol em Cajazeiras’.

Mesmo rejeitando os rituais católicos fiz minha primeira comunhão, e, pelo que me lembro, primeira e última. Como é sabido é obrigatória a confissão, e aí é que me enrolou mais ainda.  

Tinha eu, e mais uma pá de colegas, medo de enfrentar uma confissão com Padre Sitônio, que tinha um jeito calmo, um jeito de Santo, um homem puro, e eu achava que ele não merecia ouvir meus pecados para não manchar sua mente limpa.

Nem pensar confessar com Padre Gervásio, que na minha concepção iria dar-me uma lição de moral pro resto da vida. Padre Gervásio era incisivo em sua fala, em seus sermões, e em seu programa ao meio-dia na Rádio Alto Piranhas. Padre Gervásio? Tô fora!

Buscar o perdão em confissões com o Bispo Dom Zacarias Rolim de Moura era inviável, tendo em vista que suas confissões eram prolongadas, pro meu gosto, e tinha uma fila infindável de pecadores querendo limpar suas almas dos pecados arrastados nos paralelepípedos das ruas de Cajazeiras e janelas das casas que observavam a tudo e a todos com olhares sorrateiros.

Ah, tinha o Padre Vicente. Aí é que eu não ia mesmo! Vai que ele me visse por aqueles buraquinhos do confessionário e, sabendo que eu estudava no Colégio Comercial – e depois no Colégio Estadual, estaria eu passivo de broncas extras. Padre Vicente era o mais rígido de todos os padres de Cajazeiras. Certa vez eu e meio mundo do Colégio Estadual presenciamos ele rasgar a camisa de Zé Alves, meu amigo, porque Zé não o obedeceu a ir pra sala de aula logo após o recreio. Precisava dar aquele puxão? Sei que Zé Alves tinha a natureza da rebeldia, mas...

Poxa, vida, por que às freiras, mulheres dóceis por natureza - pensava eu em minha busca de solução para o xis da questão eucarística - não eram delegados poderes de confissão pelo Vaticano? Se fosse, correria eu de imediato para o Colégio Nossa Senhora de Lourdes e cairia a seus pés pedindo perdão por todos os meus pecados, mortais e veniais, por palavras, ações e pensamentos maldosos.

Ficava eu intrigado porque a Igreja – na minha visão pré-adolescente – vigiava até meus pensamentos! Então eu já estaria condenado pro fogo do inferno, tendo em vista meu desalinhamento visual para ver as coxas gostosas de meninas provocantes do colégio e até de certas professoras.

E agora, com quem eu me confessaria para sagrar meu coração ao catolicismo? Tinha uma solução, e essa solução aceitei. Meus colegas falaram pr’eu confessar-me com o padre Mister Boy, excelente professor do Diocesano, diziam os mais velhos. De origem inglesa, Mister Boy tinha trejeitos afeminados. Isso era público e notório. Então, Mister Boy era um padre ‘rilex’, como se dizia, e não tinha a austeridade dos outros padres, tinha uma melhor compreensão da juventude.

Confessei-me com Mister Boy e inventei umas bobagens e ele me pediu apenas para rezar três ave-marias e três pai-nossos. Senti que não tinha uma alma tão pesada assim. Fui comungar, e a hóstia não era segredo algum para mim. Já conhecia seu sabor. Como, se eu nunca tinha comungado? Acontece que, Dona Odília, vizinha lá de casa, e que trabalhava na Cáritas, recebia da Diocese as hóstias e fazia uma seleção retirando as quebradas e devolvendo as inteiras. Lógico, não eram bentas. Então, essas hóstias quebradas eu e meus irmãos comíamos. Era uma delícia.

Quanto a Dilma e Serra, ambos querendo ser o santo da política brasileira, deixo isso pro papa - com letra minúscula mesmo - decidir. Ele que decida. O papa, aqui no caso, é o eleitor brasileiro.


Eduardo Pereira
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Um comentário:

  1. Hilário essas "fachadas" religiosas de José Serra e Dilma.
    E quanto aos padres, esses relatos sobre cada um, eu conhecia bem de perto.
    Mas uma coisa ficou bem marcada, lá no fundinho da recordação, sobre o padre Vicente:
    Eu tinha aproximadamente 13 anos de idade,quando debaixo de um sol causticante do meio dia, eu o vi bater de palmatória nas mãos de um dos internos do colégio Diocesano e fiquei sabendo depois qual o motivo do castigo...
    Mas falando ainda sobre o padre Vicente, vi o austero padre algumas vêzes tomando "discretamente" umas dosezinhas de cachaça na budega de sua irmã Marizinha e também lembro dos enormes xarutos que ele fumava sem se preocupar em se esconder por trás de sua batina.

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