Almanaqueiras: ou não queiras.

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terça-feira, 11 de outubro de 2016

vai vendo...


Wilson Gomes

Bom dia para você, que acordou de ressaca depois de ser atropelado pelo trem da PEC de Meirelles. Achou folgada demais a aprovação de um troço tão complicado? Ah, meus amigos vocês não viram foi nada. A verdade é que ninguém resiste a uma Narrativa do Desastre Iminente Que Só Pode Ser Evitado Por Medidas Extremas de Austeridade.

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Fazia tempo que Narrativa da Austeridade (para encurtar) não aparecia nessas plagas, moldando políticas públicas, transformando economistas (esta gente que acerta tanto as previsões quanto o método cara ou coroa) em sibilas e comentaristas de economia em oráculos, com o seu vocabulário religioso segundo o qual o sofrimento que iremos infligir a A ou B é um sacrifício abnegado que será recompensado, lá bem adiante, com o Cêntuplo e mais a Eternidade. Mas quem era adulto no final dos anos 1980 e nos anos 1990 lembra-se muito bem. E perguntem aos nossos amigos portugueses o diabo pelo qual passaram recentemente diante da inexorável navalha justificada pela Narrativa da Austeridade.

Quem se opõe à Narrativa da Austeridade é um lesa-pátria irresponsável, inconsequente (vide Itamar Franco e a famosa moratória). Quem esperneia é um detentor de privilégios, inimigo da Nação e adversário das Gerações Futuras. Quem maneja a lâmina que corta e dilacera, ao contrário, é a própria Razão, que faz o que é necessário para Corrigir a insanidade dos Gastadores & Irresponsáveis do passado (estes, sim, os verdadeiros inimigos do povo) que nos levaram à Crise Medonha que nos devora. Toda a Dramaturgia da Narrativa da Austeridade (roteiro, criação de personagens e situações dramáticas, seleção de elenco, mise-en-scène) ficará a cargo do jornalismo, dos políticos austeros (vs. os políticos gastadores) e "dos economistas", criadores dos gráficos e sonoras que irão te convencer que só estão congelando o gasto público em saúde e educação por 20 anos porque te amam com amor sincero ou porque a Alternativa seria ainda muito pior.

Se você é funcionário público, prepare o lombo para o chicote. Em duas semanas a Nação terá aderido à Narrativa de que a merreca que você recebe do governo no final do mês é a causa absoluta do desemprego, da inflação, do não crescimento do PIB, da pobreza, da miséria, da crise na Previdência, do 7 a 1 da Alemanha, da cara deprimida de Meirelles e da separação de Angelina Jolie. A Folha publicará uma sondagem que mostra que 68% da população é favorável ao corte de 30% do seu salário, a Veja republicará uma capa falando dos Marajás e Bonner chamará uma matéria mostrando o impacto no PIB se funcionários públicos recebessem apenas torrões de açúcar no final do mês.
Vai vendo.

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