O público, o privado e Honoré de Balzac
Vejo nos jornais da semana que o recém eleito burgomestre de São Paulo vai tentar privatizar tudo: ciclovias, autódromo de Interlagos, Anhembi, corredores de ônibus, estádio do Pacaembu e os parques & áreas verdes da cidade - inclusive o Parque do Ibirapuera.
Ousadia? Leviandade?
João Doria Jr. nunca foi eleito para nada. Conhece o setor público como lobbista, o que sempre foi. Acompanho, há anos, sua carreira na LIDE e outras empresas que dirige: sempre foi uma espécie de corretor de luxo, com seus aviões, mansões e figurino impecável, de negócios entre os muito ricos e os políticos poderosos do momento. Bajulava esse últimos, sem exceção: de tucanos a petistas, com preferência os primeiros, é claro! Mas sempre foi um profissional na arte de cortejar ricos & políticos.
Para administrar uma cidade é preciso, mais cedo ou mais tarde, algum espírito público. Por quê? Porque o público é diferente do privado. Bens públicos pertencem ao povo, a coletividade, e não é apenas a vontade do político de plantão - o cargo é sempre provisório - que deve determinar o uso e a destinação do que é público.
Privatizar e vender sem estudos de viabilidade? Sem demonstrar os ganhos (se existirem) para a população das ações? Sem deixar explícito que as vendas & privatizações não são apenas ações entre amigos?
Quando vejo em um noviço político o afã de vender patrimônio público, fico sempre com a impressão que a preocupação maior pode estar nas comi$$õe$ geradas pelos negócio$ do que na defesa da eficiência da máquina pública.
London e New York são cidades símbolos do capitalismo mundial, estive várias vezes em ambas. Conheço bem o Hyde Park e o Central Park. Acho, apenas acho, que se um prefeito de qualquer dessas cidades tentasse "privatizá-los" seria considerado insano e internado. São parques públicos, patrimônio dos cidadãos.
João Doria Jr. começou de fato sua "grande vida" profissional aos 26 anos, indicado por Franco Montoro, em 1983, para a presidência da Paulistur, estatal do município de São Paulo. Muito jovem, apesar de inteligente, teria maturidade e experiência profissional para presidir uma empresa? Na área privada dificilmente seria presidente de coisa alguma, a não ser que a empresa fosse da família. A sua escolha foi política, simplesmente. Aos 28 anos foi presidir a Embratur, no governo Sarney, também indicado pelo então senador e ex-governador paulista. Muito jovem, não tinha curriculum para tal cargo. Indicação política, de novo. Ficou cinco anos nessas estatais.
Quando se apresentou como candidato à prefeitura de SP, ainda que muitos anos depois, apresentou considerável fortuna. Agora, que ocupará o seu primeiro cargo público eletivo, que se transformou em um homem-público, não seria interessante que ele passasse à imprensa suas Declarações de Renda (IR), de 1982 a 2016? Não seria interessante conhecermos a sua evolução patrimonial? Ele se apresentou, na campanha, como um trabalhador que logrou sucesso como empreendedor, logo não seria didático e útil fazer os seus eleitores e os cidadãos paulistanos, em geral, conhecerem a sua história real?
Por que não?
No mínimo para termos certeza que ele, João Doria Jr., é uma exceção que comprova a regra estabelecida, há mais de cem anos, pelo grande escritor francês Honoré de Balzac.
Balzac, um fino e arguto observador da sociedade e dos costumes da emergente burguesia francesa do século XIX, abordou os problemas do dinheiro, da usura e das grandes fortunas feitas com rapidez, e resumiu suas observações com uma frase de efeito, considerada por muitos como genial:
"Derrière chaque grande fortune, il y a un grand crime"
Algo como, numa tradução livre, "Por trás de cada grande fortuna, há um grande crime".
Será João Doria Jr. um herói anti-balzaquiano? Uma exceção que comprova a regra? Será?
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