O tal do amor aberto dá certo?
O leitor indaga este destemido consultor sentimental à queima-roupa, em um encontro na estação Consolação:
“O relacionamento aberto pode dar certo?”, tasca, com cara de quem está sendo passado para o último vagão dos homens no descarrilado e derradeiro metrô do amor e da sorte. “Ela propôs. Disse que é assim ou nada”.
Tive dó daquela criatura. Pensei em jogar uma teoria, lembrar do poliamor, aqueles livraços sacanas do Roberto Freire, aconselhar a leitura de “A cama na varanda” da brava Regina Navarro Lins… A delícia que pode ser tentar sair por ai, à franciscana, sempre na base do é dando que se recebe.
Fiquei tentado também a presenteá-lo com o bilhete único da obviedade rodriguiana:
Meio amor não é amor, cai fora, se liga. Se fechado não funciona, imagina na base do “oh! rebuceteio”, como na ilustração acima do gênio italiano Milo Manara!
O sujeito de meia idade, vestes invernosas puídas em plena primavera, exalava a naftalina de outras dores acumuladas no guarda-roupa:
“Me ajuda”, disse, em um abraço de cortar coração, passarinha, fígado, moela e todos os miúdos da humanidade.
Era uma dessas criaturas infelizes no amor. Ponto.
Tentei reanimá-lo com aqueles clichês da esperança a qualquer custo que aprendi nos filmes de Frank Capra. Levei o desalmado para uma bisteca crepuscular no “Sujinho”, estabelecimento que sempre funcionou como a minha clínica sangrenta de psicanálise selvagem.
Na primeira cerveja ele chorou por ela. Para tentar desconstruir minimamente o mito do amor romântico, perguntei: “Gostosa?”
“A única que me levou ao nirvana!”, diz Roberto, na casa dos cinquenta, babando na bisteca, inconformado. “Amor aberto, amor aberto, amor aberto”, balbucia, obsessivo. “Amor aberto, amor aberto, amor aberto…”
Realmente o amor aberto é uma beleza. Para o(a) dono(a) da iniciativa, da chave e do cadeado. Para quem decide abrir a cancela dos sentimentos, para quem grita primeiro pelo menino da porteira.
O pior da proposta de amor aberto, fui obrigado a alertar o Roberto, é que pode ser um baita truque. Coisa de quem está apenas te largando para viver um aferrolhado e fidelíssimo amor com outro(a).
Muitas vezes a tese do amor aberto não passa de uma desculpa menos dolorosa (menos?) para dizer que está indo embora. “Preciso ter o meu espaço etc”. Aquela coisa meio doutor Smith perdido nas galáxias dos sentimentos.
Toda vez que escuto a expressão amor aberto, me fecho para balanço.
Com a ajuda dos generosos garçons, coloquei Roberto num táxi rumo à praça da Árvore.
Ele babava: “Amor aberto, amor aberto, amor aberto…”
E você, amigo(a), já teve sim alguma experiência do gênero? Isso existe ou é penas coisa de livro e tese? Funciona? Digaí.
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