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quarta-feira, 29 de maio de 2013

Veja bem, preste atenção

“É um absurdo torturador processar torturado no Brasil”, diz jornalista


Por Marina Dias - Terra Magazine

"Um torturador processar um torturado no momento em que o Brasil dá os primeiros passos para que a verdade venha à tona é absurdo", afirma o jornalista Emiliano José, de 67 anos. Doutor em Comunicação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Emiliano está sendo processado pelo pastor da Igreja Batista Caminho das Árvores e ex-oficial da Polícia Militar da Bahia, Átila Brandão, um dos chefes da repressão aos estudantes e aos militantes que combatiam a ditadura.

Em 11 de fevereiro deste ano, Emiliano José publicou no jornal baiano A Tarde um texto intitulado "As premonições de Yaiá", que traz, em primeira pessoa, o depoimento de Maria Helena Rocha Afonso, mãe do ex-preso político Renato Afonso de Carvalho.

Era 1971 quando D. Yaiá, como era conhecida, sentiu que precisava ver o filho, preso no Quartel da Polícia Militar do Dendezeiros, em Salvador. Ao passar pelo sentinela, começou a fazer barulho e a gritar pelo nome de Renato. Assim, relata, conseguiu interromper uma sessão de tortura comandada pelo então oficial da PM Átila Brandão.

Emiliano escreveu outro texto sobre o caso, desta vez publicado no site da revista Carta Capital, com o título "Corpo amputado querendo se recompor", em que o filho de D. Yaiá reafirma as denúncias contra seu algoz.

Em abril, o pastor e ex-PM entrou na Justiça com duas ações contra Emiliano José. Uma queixa-crime, que ainda tramita pois não houve conciliação na primeira audiência, em 17 de maio, e um pedido para que os textos fossem retirados do site do jornalista e das publicações. Além disso, Átila Brandão reivindica um direito de resposta e uma indenização no valor de R$ 2 milhões, por se considerar vítima de calúnia e difamação.

"Atuei como jornalista. Publiquei uma história com base em duas fontes que mostraram o rosto, deram seus nomes verdadeiros. Para mim, o que importa é o depoimento do torturado. Que razão ele teria para mentir?", questiona Emiliano em conversa com Terra Magazine.

A juíza Marielza Brandão, da 29ª Vara dos Feitos Cíveis, Comerciais e Relação de Consumo da Comarca de Salvador, determinou, por meio de liminar, que o texto fosse retirado do blog do jornalista e que Átila teria o direito de resposta no jornal A Tarde. No entanto, indeferiu os pedidos quanto à Carta Capital. Emiliano recorreu da decisão.

"Sou um torturado e agora, ironicamente, sou processado por um cara acusado de praticar tortura. Quem tem que se explicar na Justiça são os acusados de tortura e não o contrário", diz o jornalista. Para ele, retirar seu texto do ar foi uma "medida inócua". "É impossível censurar a internet".

Emiliano José foi professor universitário por 25 anos, deputado federal, deputado estadual e vereador pelo PT de Salvador. Escreveu vários livros sobre o resgate da memória da ditadura no Brasil (1964-1985) e passou pela redação de jornais como O Estado de S.Paulo, O Globo e Jornal da Bahia. Durante o regime militar, ficou preso por quatro anos e foi torturado. 

"Átila Brandão imaginava que, colocando o caso na Justiça, iria me intimidar, mas isso é apenas uma doce ilusão. Não cometi nenhuma irresponsabilidade e não vou deixar que ele cerceie a liberdade de expressão", diz o jornalista.

O pastor e ex-PM tem dito que não quer se pronunciar sobre sua atuação durante a ditadura no Brasil.

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