Almanaqueiras: ou não queiras.

Almanaqueiras: ou não queiras.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

o nordestino precisa de chuva, para viver e para fazer renascer suas esperanças.


Um retrato desolador da seca

Nonato Guedes, com agência AL-PB


foto ilustrativa



O relatório produzido pela Assembleia Legislativa da Paraíba sobre a Caravana da Seca que percorreu municípios do interior, em diferentes regiões, mostra um quadro desolador como decorrência da calamidade. A cada parada, o relato do sofrimento e das dificuldades para conseguir água de beber e para manter o rebanho vivo. Ao longo do trajeto foi verificado o avanço da desertificação, bem como a presença da praga da cochonila, que acaba, pouco a pouco, com a palma forrageira, planta forte que tem a capacidade de resistir a estiagens prolongadas e constitui o único alimento para os animais. Nove sessões especiais foram realizadas em Câmaras de vereadores, aglutinando prefeitos, edis, agricultores e representantes de entidades locais. Todos queriam contar histórias de sofrimento e de desesperança.

foto ilustrativa


Verdadeiros cemitérios de animais foram descobertos. Em Boqueirão de Piranhas, distrito de Cajazeiras, uma placa escrita com português incorreto passava a mensagem: “Apartir de hoje esta proibido botar qualquer tipu de animal morto neste terreno”. Ao fundo, podiam ser vistas ossadas de animais, sinal de que o recado não tinha sido atendido. Próximo a duas vacas mortas, o agricultor José Braz Macedo, 61 anos, narrava sua tragédia: “Eu vou dividir meu pão com eles. Não vou perder meus animais”. Ele é morador do sítio Pitombeiras, no município de Ouro Velho. Retira dinheiro da aposentadoria para dar comida a duas vacas. Para completar a ração dos animais, o agricultor está utilizando mandacaru, uma planta bastante espinhosa. Mesmo sendo uma espécie típica de terra árida, o agricultor relatou que até essa planta está difícil de encontrar na seca atual. O mandacaru que ele exibia tinha vindo de Pernambuco, e ele pagou a conta. Em Pombal, o produtor rural Geraldo Dantas da Costa informou que cria gado. Já tem uma dívida de mais de R$ 80 mil, que tomou emprestado aos vizinhos. “Eu perdi seis vacas, mas na região existem fazendeiros que já perderam de 400 a 500 cabeças de gado”.

No sítio Tingui, no município de Monteiro, o criador Francisco de Assis Leite da Cruz avisa que tem que se deslocar para Boa Vista, a 140 quilômetros do lugar onde mora, à busca de mandacaru que será utilizado na alimentação do rebanho de 26 vacas. O produtor pega os cactos que ficam na beira da estrada. Revela que perdeu toda a palma que plantou por causa da seca e da praga da cochonilha. “Eu também tenho que comprar ração, complementada com os cactos para alimentar os animais”, disse. No sítio Cachoeirinha de Cima, no município de Supé, o produtor José Patriota Alcântara informou que já perdeu 55 reses este ano, restando um rebanho de 40 animais. Viúvo e com deficiência na fala, ele toca a propriedade, de 950 hectares, juntamente com o amigo José Severino Andrade. Segundo José Severino, a seca de 1993 foi grande, “mas essa está pior”. Na outra, havia palma forrageirana região. Agora, as plantações foram destruídas pela cochonila do carmim.

Um veterinário e criador do município de Sumé, Wandson Braz, também sofre com os problemas da seca. Reclama que as políticas públicas não são específicas para o semiárido. “Esta região precisa, principalmente, de subsídios. Hoje os criadores têm muitas dívidas rurais, junto às instituições financeiras; as políticas de crédito não são compatíveis”. De acordo com um trabalho da Fundação Getúlio Vargas, 45% dos encargos das dívidas dos produtores rurais do Nordeste são ilegais. Cinco mil agricultores já foram executados judicialmente e estão prestes a perder suas propriedades. Alertou, também, para o processo de desertificação e aponta, entre outros fatores, o desmatamento para uso da lenha, bem como a implantação desordenada de pastagens com capim buffel. “Não sou contra o uso dessa gramínea, mas os cultivos estão sendo feitos com desmatamentos grosseiros, queimadas e uso de herbicidas. Isso está destruindo a caatinga. O bioma caatinga é sensível, e muito rico, mas precisa de socorro imediato, porque o processo de degradação é acelerado”, afirma. José Carlos Marinho, produtor do sítio São José, em Soledade, tem um pequeno rebanho leiteiro. Para sustentar os animais, compra ração e complementa com coroa de frade, um cacto típico da caatinga. Ele ainda mantém um pequeno plantio de palma forrageira, feito há dois anos, mas que está murchando devido à falta de água ea cochonila do carmim. A parte atingida, ele arrancou; logo alimentou o gado, mas voltou a descobrir plantas atacadas pela praga. “Vou arrancar as plantas imediatamente e dar ao gado, antes que perca tudo”, contou.


Esta é uma parte do documento que a Assembleia Legislativa da Paraíba deseja entregar à presidente Dilma Rousseff para sensibilizá-la com vistas à adoção de medidas emergenciais e permanentes. Porque, no sertão paraibano, a vida pede socorro. E o nordestino precisa de chuva, para viver e para fazer renascerem suas esperanças.


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