Almanaqueiras: ou não queiras.

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domingo, 6 de fevereiro de 2011

O “ENGENHO DE PAU” de Constantino Cartaxo

Tantino e esposa
                                                      
Tantino e filho do nosso poeta maior Cristiano Cartaxo

Bati a última página do livro Engenho de Pau do poeta cajazeirense Constantino Cartaxo e senti o gosto de quero mais. Esse livro foi publicado em 2007 e o próprio Tantino diz na apresentação como é a feitura dessa obra: “Neste meu livro, distintos leitores, vocês não irão encontrar as concordâncias da nossa gramática e muito menos a pronúncia correta do nosso idioma. Traduzo, fielmente, não só o pensamento de nosso homem sertanejo, como também, o seu palavreado reproduzindo-o, na escrita, de acordo com sua pronúncia, com o seu modo fácil e simples de esse expressar”. 
Dito isso, poderia eu não falar mais nada, mas na ânsia de leitor, inda mais por se tratar de literatura de nossa gente, gente fina de Cajazeiras, vou revelar alguns trechos que destaco para deixar o leitor também com o gostinho de querer ler nosso poeta, filho de outro poeta mor de Cajazeiras, o Dr. Cristiano Cartaxo Rolim.
 Antes, algumas informações. O livro é prefaciado por Tarcísio Osterne Carneiro, advogado, historiador e escritor, onde ele afirma que: “O autor... ombreia-se na Literatura de Cordel aos maiores poetas populares brasileiros, como Leandro Gomes de Barros, Patativa do Assaré e Zé da Luz...”
O livro também traz opiniões de pessoas gabaritadas, como Gabriel Alves de Oliveira, Dr. em Literatura Francesa, Universidade de Lion, França, Professor da UFPB e escritor. Disse ele: “... Não poderia haver título mais bonito para o livro, nem mais significativo. Nada tanto como ele está em harmonia com uma obra na linha de literatura de cordel e no ‘linguajá puro e são’ do povo do Nordeste...”
Outra opinião é a de nosso conhecido José Antonio de Albuquerque, professor da UFPB-Historiador e jornalista. Disse ele: “Não conheço, no nosso sertão áspero e seco, outro que trabalhe a literatura de cordel com fluidez, perfeição, sensibilidade, emoção, talento e inspiração, como Tantino”. E acrescenta: “Este é Tantino... que não admite que ninguém goste mais de sua cidade do que ele”.
Também temos a opinião de José Anchieta César de Lima, que tem Licenciatura Plena em Letras pela UFPB e é Jornalista. Disse Anchieta: “Ler essa obra é mergulhar num cenário bem sertanejo, de muita satisfação e saudade, marcado, sobretudo, pela resistência dos camponeses às intempéries da vida e às desigualdades sociais. A oportunidade de aprender a ler e escrever não foi possível, porque a única escola para muitos desses trabalhadores, foi o cultivo da terra”.
Destaco algumas passagens em que Tantino manifesta humor nos seguintes poemas:
PRESSÃO ARTERIAL (o médico recomenda ao cliente fazer caminhada para melhorar a pressão arterial, e ele faz caminhada perto da praia observando as pessoas)
Vi muita gente formosa,
vi muié religiosa
desbuiando os grão dos terço
...
Muié feia tumbém via,
no meu oiá parecia
tê nascido pelo avesso
...
Sem querê vi dois veim...
Ela alegre, sorridente
e ele palitando o dente
cum sua chapa na mão.
...
Moça de carça encurtada
vestindo laica colada
mostrando o capuz do fusca.
...
Uma nesgada de pano
ocupando pouco espaço
nas carne mole que afunda,
deixando as popa da bunda
partida em quatro pedaço
...
A pressão tá controlada.
Por muié feia tirada
sua tendência é cair.
Sendo a enfermeira bonita
a minha pressão se agita,
se dana e pega a subir.

O MAR
...
Quando o mar sorta seu grito
repetindo o mesmo brado
parece um disco enganchado,
mas, mesmo assim, é bonito.
Acho lindo ele brigando
na cara das peda dando
bofete que inté revorta.
Bate e fica furioso
quiném cururu teimoso
que a gente tange e ele vorta.
...

SE JESUS VOLTAR
...
Desejo que o Sinhô veja
cuma tudo é deferente.
Tem um magote de gente
que só qué sabê de igreja.

E se tá mesmo rezando,
pelo jeito eu escutando,
inté mesmo a reza nega,
que, às vezes, chega me espanto,
tanta igreja em tanto canto
que se parece bodega.
...

SATISFAÇÃO DE MATUTO
...
A véia fica ao meu lado.

Eu espio os oio dela...
ela espia os oio meu...
à lua nós damo adeus
provocando inveja nela.

Eu feciho a porta de baixo.
Dispois a porta de cima.
Me encosto mais junto dela
mode  esquentá nosso fogo
pra miorá nosso clima.

Logo apago o candeeiro
aumentando a escuridão.
Fazemo o nome do Pade...
rezamo a nossa oração...
dispois, nóis pega a se ri...
Aí, nós se dana a se ri...
nós num tem televisão!
...

SUGESTÃO A SÃO PEDRO
...
Pra amenizá nossas mágoa
tudo o que nós qué é água
para aguá o sertão
e armentá nossa alegria
dê pras nuve melancia
mode elas mijá no chão.
...

PROPAGANDA ELEITORAL
...
Junto aos poste pendurado
só tem retrato pregado,
parece fila indiana,
cum punhado de sacana
mostrando os riso forçado.
...

QUERMESSE
...
Tem doce de toda cô, 
mas o de mió sabô
era o mais escurecido,
servido em tacho de argila.

Pessoá, fazia fila
pra comê o preferido.
...
E de que fruta é feito?
Um doce bom desse jeito...
eu quero a receita agora.
E de que é que se faz isso?
Sangue de poico, é chouriço...
Botaro tudo pra fora.

Foram 204 páginas de puro deleite, e recomendo a todos. Isso aí acima foi apenas uma canja, o resto vocês não manja.
Eduardo Pereira
E-mail: dudaleu1@gmail.com

Capa do livro de Tantino



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