Em 1969 pouquíssimas pessoas tinham televisão em Cajazeiras e, os que não tinham, procuravam se virar para assitir a algum evento especial. Preta e branca, a principiante programação televisiva brasileira ainda não dominava a atenção das pessoas a ponto de retirá-las dos passeios da Praça João Pessoa e nem dos cinemas Éden, Pax e Apollo XI.
Se aparecesse um fato peculiar, aí sim, a procura pela televisão despertaria algum interesse. E foi exatamente a importância criada em torno de um fato que me ligou ao televisor da casa do maestro Esmerindo Cabrinha, meu vizinho, pois na minha casa, por essa época, nem de longe dava para se pensar nesse artigo de luxo. E que evento foi esse? Nada mais do que a marca histórica do milésimo gol de Pelé.
Era eu guri, mas como lá em casa todos meus irmãos torciam por algum time, e meus colegas também, então era inevitável a curiosidade pelo futebol, e o milésimo gol de Pelé era chamativo de atenção porque era em cima do meu time, o Vasco da Gama.
A expectativa era grande por esse gol singular na carreira do maior ídolo futebolístico brasileiro, tendo em vista que nos jogos que precederam a esse do Vasco, a pergunta que não queria se calar era se Pelé iria assinalar sua marca histórica em tais jogos.
Da janela da casa de ‘seu’ Esmerindo Cabrinha, pelo lado da rua, vi Pelé marcar seu milésimo gol. Mas o que me chamou a atenção não foi nem o gol em si, e nem a corrida da imprensa ao encontro de Pelé no fundo da rede. O que me chamou a atenção foram os murros que Andrada, goleiro do Vasco, deu no gramado com raiva porque não conseguira alcançar a bola por pouco. Os recursos tecnológicos eram impossíveis de focar sua boca para saber o que ele tanto esbravejava, como ocorre hoje em dia, mas me pareceu que ele estava falando puto de raiva o seguinte: “merda! Porra! Caralho! Buceta! Filho da puta!”.
Eu, como infante torcedor vascaíno, não queria que Pelé fizesse aquele gol, porque a gozação de meus colegas da Praça do Espinho seria uma humilhação, como o próprio Andrada não queria sofrer aquele gol por achar que seria lembrado pelo resto da vida por ter sofrido o milésimo gol, e não porque era um excelente goleiro.
O jornal Folha de São Paulo, há poucos anos descobriu, através de recontagem minuciosa dos gols oficiais, que esse milésimo gol de Pelé não ocorreu no Vasco da Gama, e sim, no time de uma cidade próxima, quer dizer, relativamente próxima à Cajazeiras. Foi no Botafogo da Paraíba. O jogo foi em João Pessoa. Provavelmente algum cajazeirense deve ter assistido a esse jogo histórico.
No ano seguinte, 1970, também presenciei a mais um espetáculo de Pelé. Dessa vez foi à Copa do Mundo do México. E mais uma vez em televisão alheia. Foi no Cine Éden. Não me lembro se foram todos os jogos. Foi colocada uma televisão no palco – o preto e branco ainda reinava - e o cinema lotou. Era de graça. Quem sentava nas cadeiras da frente se dava bem, pois em contraposição com o telão do cinema, a telinha se perdia. Praticamente só se via e não se escutava. Melhor dizendo: escutar a gene escutava, mas apenas o converseiro frenético da torcida. As cadeiras do Éden eram de madeira, sempre foram, e a inclinação do piso, da entrada ao palco, era razoável, mas nada evitava os pesqueiros no coco da molecada de trás na da frente. Mas nada de preocupação com isso. O importante era o jogo, a vibração pela seleção.
Nos anos seguintes comecei a conhecer melhor o Santos e Pelé através da revista Placar, que surgiu em 1970, pois Mininim (Pereira Filho) meu irmão, era assinante dela. Era uma revista bonita, prazerosa de se ver.
Eduardo Pereira
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