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quarta-feira, 23 de maio de 2018

Governo e Congresso jogam dinheiro fora para conseguir desconto de no máximo R$ 0,07

Esmola eleitoreira com a gasolina

Vinicius Torres Freire 


Governo e Congresso jogam dinheiro fora para conseguir desconto de no máximo R$ 0,07


Sete centavos. É quanto pode baixar o preço da gasolina caso seja repassada para o consumidor a zeragem da Cide, imposto cobrado sobre combustíveis. No caso do diesel, cinco centavos.

Hum.

Esse desconto deve ser diluído na cadeia de distribuição. Se não sumir por aí, bastam uns três reajustes da Petrobras para que esses centavos escorram pelo ralo.

É no que vai dar a promessa dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB), combinada com Michel Temer, adiantada no caso do diesel, “tentativa” na gasolina.

Zerando a Cide sobre todos os combustíveis, o governo federal vai perder cerca de R$ 4,1 bilhões em receita de impostos, em um ano. Estados e municípios, R$ 1,7 bilhão. É o custo do populismo.

GASOLINA TRIBUTADA
Em São Paulo, onde o preço da gasolina é menos salgado, o litro custava em média R$ 3,95 no começo de maio, segundo a ANP. Cerca de 34% desse valor é imposto indireto (PIS/Cofins, Cide e ICMS), o equivalente a R$ 1,34.

No Rio, onde a gasolina é cara, o litro saía por R$ 4,70, em média, com 42% de imposto indireto, o equivalente a R$ 1,97. Por falar no assunto, o imposto sobre a gasolina é maior nos estados mais falidos: Rio, Minas e Rio Grande do Sul.

Em julho do ano passado, o governo federal, na pindaíba, aumentou o PIS/Cofins sobre a gasolina. Passou a cobrar mais R$ 0,33 por litro de gasolina misturada a etanol. Desde então, a margem (“lucro”) das empresas distribuidoras de combustíveis diminui um pouco. Os sete centavos de Maia e Oliveira podem alegrar essas empresas.

Sim, o preço da gasolina da Petrobras é alto, dada a nossa relativa pobreza de país de renda média que paga de resto imposto “europeu” sobre combustíveis. Mas está mais ou menos em linha com os do mercado mundial, uns 10% abaixo, no cálculo de alguns especialistas.

Bulir com preços tem efeito em geral ruim. Alguém paga o favor e, enfim, é uma distorção econômica estimular o consumo de um bem que está caro, passando a conta para alguém.

A Petrobras pagou essa conta, sob Dilma Rousseff, e foi à ruína, o que agravou a recessão. O governo pode pagar a conta, via subsídios disfarçados, baixando impostos (privilegiando quem tem carro). Como o governo está quebrado, vai ter de cortar mais gasto ou fazer mais dívida.

Sim, a Cide é um imposto regulatório, que servia justamente para atenuar os reajustes por um tempo. Quando o preço da Petrobras subia, baixava-se o imposto, e vice-versa.

A petroleira poderia assim cobrar preço de mercado; o governo absorvia as variações, por um tempo. A Cide era uma espécie de fundo regulador de preços.

Dentro de certos limites de variações de preços mundiais, era possível estabilizar o custo para o consumidor, evitar choques, um paliativo conveniente para uma economia torta como a do Brasil. Mas, se o preço mundial mudava muito por muito tempo, era preciso repassar a variação, para cima ou para baixo. Dilma zerou a Cide e acabou com o atenuante; Temer a imita.

É possível fazer algo mais? Os impostos federais sobre combustíveis são um valor fixo por litro (por exemplo, R$ 0,65 por litro de gasolina com etanol). O ICMS, estadual, é uma porcentagem, método de cobrança que amplifica a variação dos preços. Mas, caso os estados aceitassem a mudança, fixariam o valor do imposto pelo teto.

Mexer em preço é ruim. Saídas, só de médio prazo. A concorrência de energia mais limpa pode ajudar (mesmo o etanol), temos de usar menos carro, os veículos têm de ser mais eficientes.

Vinicius Torres Freire
Na Folha desde 1991. Foi secretário de Redação, editor de 'Dinheiro', 'Opinião' e correspondente em Paris.

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