Almanaqueiras: ou não queiras.

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quarta-feira, 21 de março de 2018

estou convencido de que a lógica empresarial por trás da experiência que vivi é muito ruim para o país, pois mexe com o sonho e com a imaginação de muita gente em nome de nada, além do lucro da própria empresa.


Exatamente 1 ano atrás, finalmente e felizmente, eu deixava o BBB. Nunca havia assistido ao programa, mas aceitei o desafio de participar de uma edição. 

Avaliava que não conseguiria ficar nem um mês dentro da casa - acabei ficando dois -, mas que minha participação seria útil para uma eventual candidatura a deputado federal, e realmente foi. Minha pré-candidatura, até o momento da minha desistência, estava bem estruturada.

A imagem pode conter: 2 pessoas, pessoas sorrindo, pessoas em pé e barba

 Não posso reclamar: por meio do programa, muita gente teve acesso às minhas ideias e passou a apoiá-las, mas lhes asseguro que o programa é uma experiência muito menos interessante do que cada um de vocês tem nas suas vidas cotidianas, com problemas e desafios de verdade. Costumo dizer que passar dois meses em uma casa confortável, com comida e água, é muito mais fácil do que batalhar o leitinho das crianças todo mês, como fazem milhões de brasileiros todos os dias.

Essa passagem pelo BBB apenas reforçou uma triste avaliação sobre nossos meios de comunicação: nenhum compromisso com o desenvolvimento do país. Apenas um projeto empresarial que explora as fragilidades da nossa sociedade, como o desejo generalizado de consumir fofocas e, de quebra, consumir os produtos mostrados no comercial. Além disso, o desejo de pertencer a uma torcida - como no futebol. Participar de uma torcida é cômodo, livra o sujeito de pensar e avaliar a complexidade do mundo. "Meu grupo, meu time, meu brother" são formas de simplificar o mundo - e dividi-lo em "nós e eles" - , mas impendem de ver os equívocos que nos empurram goela abaixo, incluindo a programação da televisão e a grande maioria dos políticos. 
Aqui tenho de ser justo, a lógica equivocada de as pessoas se organizarem em torcida não é exclusividade do programa, nem foi criada por ele, mas certamente é explorado por ele -
assim como o interesse geral em fofocas sem importância -
e ganha força com ele. Infelizmente, entretanto, essa lógica tomou conta também do debate político, com a futebolização (e simplificação) de todos os temas complexos da sociedade, como se fosse possível separar tudo nas caixinhas "coxinha" e "mortadela" (ou anti-direita e anti-esquerda), como se o mundo fosse assim, preto e branco (ou, no linguajar do BBB brother A X brother B). As pessoas esquecem que suas vidas, muito mais importantes do que isso, são quase sempre, uma combinação de preto e branco, num cinza sem fronteiras aparente e muitos tons (muito mais do que 50 tons de cinza). É triste fazer essas constatações, mas somente com clareza sobre elas é possível buscar soluções reais para nossos problemas reais. 

Não me arrependo de ter participado, nem de longe, mas estou convencido de que a lógica empresarial por trás da experiência que vivi é muito ruim para o país, pois mexe com o sonho e com a imaginação de muita gente em nome de nada, além do lucro da própria empresa.

Rômulo Neves

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